Ang Lo entrevistado - Publicada originalmente no Blog Shine Magazine em 17 de maio de 2009


Representante da mais nova geração do underground carioca, a ultra hardcore REPÚDIO, inspirou-se no livro "Anarquia Planetária e a Cena Brasileira" do jornalista Sílvio Essinger. Suas influências musicais sublinham o cotidiano musical de seus integrantes e servem de base a uma pegada crossover, punk-rock, thash-metal e, logicamente, muito hardcore. Com dezenas de shows pelo circuito underground carioca, a banda lançou seu primeiro disco - Pra Que Entender? - pelos selos independentes Parayba Records! e Bandas do Oeste. A "tosqueira" é profissional e tem lançamento simultâneo no Japão pelo selo Karasu Killer, que lança e promove shows de bandas brazucas na terra do sol nascente. Produzido e mixado por Rafael Parra(Ataque Periférico), "Pra Que Entender?" vem tendo boa repercussão de público e crítica. A Shine/MD conversou com o baixista (também dj nas horas vagas) Angelo (DJ Ang Lo para os íntimos) para tirar tudo isso à limpo e mais uma vez comprovamos que a sonoridade de uma determinada banda nem sempre reflete claramente as personalidades inusitadas de todos os integrantes. Ang Lo é reggueiro, articulado e gente fina. Gosta de conversar e se não fosse via msn, essa prosa poderia ter se realizado perfeitamente numa roda de samba descompromissada.

texto e entrevista por Porão
foto de abertura: Porão
fotos com logo: Michael Meneses
fotos com montagem: Divulgação Repúdio

Shine - Tocar o verdadeiro hardcore no Brasil, para quem é músico e sempre quis ter uma banda,acaba sendo uma tarefa cruel. Digo isso porque algumas palhaçadas chamadas de hardcore até fazem bastante sucesso, mas o verdadeiro punk hardcore... Enfim, como se encontraram e resolveram formar a banda?

Ang Lo - Na verdade é realmente muito difícil se manter num meio onde não há incentivos, ao contrário disso, temos todos os motivos para abandonar essa vertente. O que move mesmo é o amor ao que se faz e a amizade que nos une. Ver o público curtindo o nosso som é o maior incentivo, é o que carrega nossas baterias. Todos os quatro são remanescentes de bandas extintas do underground carioca: o Zumby foi do Guerrilha, o Dagotta da Flunders e o Magno e eu, éramos da Pau de Sebo. Já nos conhecíamos há muitos anos quando o Zumby veio com o conceito de formar uma banda para colocar nossas idéias de críticas e melhorias para uma conscientização da sociedade. Daí nasceu a Repúdio.

Shine - Fizeram ou fazem parte de alguma suposta cena punk no Rio? Acreditam nestes movimentos? Com que bandas interagem?

Ang Lo - O Zumby tinha uma ligação muito forte, na verdade ainda tem, com o pessoal da cena punk carioca. Já os demais integrantes não são tão atuantes nesse sentido. Com relação a acreditar num movimento punk, é um pouco relativo. Conversamos muito sobre os temas e todos nós somos defensores ferrenhos da anarquia; mas sabemos que é um pouco complicado, na atual conjuntura, implantar um sistema assim. Precisaria muita informação, às claras, e em primeiro lugar, os seres humanos deveriam enxergar-se como seres cosmoviventes e não egovividos. No que resta da cena independente do Rio, a Repúdio interage bem com bandas de vários estilos. Devido à bagagem que adquirimos com o tempo de underground, conhecemos músicos dentro de todas as vertentes musicais. Por exemplo, temos um projeto de criar um festival radicalmente eclético, colocando juntas bandas e grupos que tocam diversos tipos de som. Mas se for pra citar alguns nomes, digo que, dentro do Rock, temos muita afinidade com o pessoal da banda Halé, do Ataque Periférico, do Plastic Fire, do Nodora e do Massacre Urbano; É difícil demais dizer todas pois sempre acaba se esquecendo de alguém...

Shine - Chamem-me para participar deste festival! Em que região vocês residem e por onde já tocaram?

Ang Lo - A banda está espalhada pelo Rio: o Zumby é de Piedade, o Magno de Madureira, Dagotta de Ricardo de Albuquerque, o Kfé (novo guitarrista), de Inhoaíba,e eu, de Bangu. Claro que te convido pra esse festival, se um dia conseguirmos tirá-lo do papel!! Rapaz, já tocamos em muitos lugares pelo Rio todo. Tocamos em palcos consagrados como o Garage, em pés sujos como a Gruta do Silva, que é em Campo Grande. Já tocamos do céu ao Inferno do Rio de Janeiro!

Shine - Acha que há uma interação como um todo aqui no Rio, ou rola uma certa segregação cultural zona norte e baixada x zona sul?

Ang Lo - Acredito que não. Conhecemos muitas pessoas de todos esses lugares, sendo sorte ou não, já tocamos em todos os lugares e sempre fomos recebidos da mesma maneira. Fizemos um show na AudioRebel(Botafogo) com uns gringos croatas(Gods Cracked Skull), outro em Bangu com os amigos que foram supracitados, com o Cólera, em Nitéroi (no qual você estava), em Cascadura, com os japoneses do Vivisik, Fuck on The Beach e Mukeka di Rato; Vários shows na baixada, em Mesquita ou Caxias, e sempre o público, apesar de diferente demais, tem reagido da mesma maneira. Pelo menos nós não temos sofrido esse tipo de preconceito.

Shine - Esquenta não, são restícios de meu recalque: minhas fotos, por exemplo, já foram barradas tanto em sexyshop tijucana como em festinha de "burguês esotérico do Leblon, metido à artista espirtualizado". Mas que tipo de bandas vocês costumam ouvir? Somente "porradeira" core?

Ang Lo - (risos) Gostei da definição do "burguês esotérico metido à artista espiritualizado" Rapaz, quanto às bandas, o negócio é bem diversificado: o Zumby é o punk mais clássico, o 77, Magno, o Metaleiro da banda...(risos); o Dagotta já curte um som mais alternativo, bandas gringas e tal... eu sou o farofeiro, ouço tudo que sair som...reggae principalmente, mas passando por Samba, Jazz, Funk, Bossa, Música Eletrônica, Instrumental Brasileiro, etc. Fora o que eles ouvem!

Shine - Vai rolar um festival de jazz & blues muito bom agora em Junho, em Rio das Ostras! Curtem festivais de outros estilos? Quais as bandas clássicas do Hardcore Mundial na opinião da banda?

Ang Lo - Cara, fui nesse festival de Rio das Ostras há 2 anos atrás, por causa do trabalho. Se eu pudesse (quesito grana e tempo), estaria lá, com toda certeza. A galera toda curte sim! O Zumby é um pouco mais fechadão, mas também gosta de várias coisas; Quanto ao HC mundial, é difícil dizer. Com certeza, entre as clássicas, está o RxDxPx, acho que nós os brasileiros fazemos o melhor HC do mundo! Mas tem a galera da Finlândia que manda muito bem também!!

Shine - Duas coisas acontecem simultanemente na cena hardcore a meu ver: no show do Cólera, em que estivemos e você citou, chego a ficar bem emocionado com a alegria de uma banda de 30 anos, ao tocar ali para seus seguidores. Por outro lado, o excesso de tosqueira na/da produção me dá um pouco de angústia. Será que por ser punk, hardcore, sempre tem de ser assim?

Ang Lo - Quando a tosqueira é proposital, torna-se forma de expressão, mas quando é falta de conhecimento e recurso, aí é complicado. Falta de recuros é algo que enfrentamos em quase todos os shows. No Rio, a qualidade do equipamento de som é um problema gravíssimo, mas que pode ser superado pela boa vontade em fazer as coisas acontecerem. Muitas vezes o cara tem a boa vontade de realizar o evento, mas não tem grana pra levantar uma estrutura apropriada. Como te disse antes, não temos incentivo financeiro de grandes corporações para esse tipo de cultura alternativa, até porque elas algumas vezes sofrem com os efeitos da militância que nós mesmos realizamos. Eles não financiariam um tiro no próprio pé. Aí fica complicado: sem dinheiro, não temos estrutura boa; sem estrutura boa, vira tosqueira.(risos). Na verdade, o termo é estrutura adequada. Mas ainda bem que temos militantes da boa vontade, que são vocês, da mídia alternativa, que trazem à público, as coisas que não conseguiremos ver, curtir e saber, de maneira alguma, no mainstream.

Shine - Mas o Rio é tôsco! Não temos nem uma rádio decente para nos representar e ouvir?

Ang Lo - É, vamos dizer que o Rio é carente!




Shine - O que o Repúdio vai aprontar pra sanar um pouco essa carência em 2009?

Ang Lo - Bom, a Repúdio vem com o álbum "Prá que Entender?" que é um álbum conceitual. Esse álbum, na minha opinião, sintetiza o que nós já falamos aqui. Foi gravado em dezembro de 2007 e lançado somente em fevereiro de 2009, devido à tentativa de captação de recursos para realização do projeto. nos queríamos gravar com qualidade e lançar também um material que tenha qualidade, não só sonora, mas também artística, no sentido gráfico. No geral, acho que conseguimos e sem precisar nos submeter aos interesses comerciais. Conversamos muito com várias pessoas e através do conglomerado de selos (Parayba Records, Karasu Killers- Japão e Bandas do Oeste) que estão no verso do cd, e mais um rateio dentro da própria banda, conseguimos por na rua o cd e agora estamos na batalha, tentando marcar os show para a divulgação desse trabalho, que para nós, é como um filho. Também rolaram shows muito bons e esperamos poder levar nosso "barulho", ao vivo e a cores, dessa vez para fora das fronteiras do Rio de Janeiro.

Shine - E como tem sido e/ou como funciona essa parceria com o jornalista/fotógrafo Michael Meneses Parayba? Ele é uma espécie de membro externo da banda?

Ang Lo - Acho que você resumiu bem: o Parayba é um cara super atuante no sentido de produção da banda. É meio que o empresário da gente. Para ser um empresário de verdade, só falta ele ganhar dinheiro às nossas custas (risos); Sacanagens à parte, o Michael é um grande amigo, que tem nos dado muita força nessa senda espinhosa que é a cena da música alternativa. O cara, nos fotografa, organiza agenda, lembra até do lanche...Além de nos influenciar muito também como ser humano, militante por um mundo melhor.

Shine - A última é totalmente livre para falar o que quiser e para quem quiser:

Ang Lo - Mas é o fim, já?!? O "bate-papo" tá maneiro(risos)

Shine - Bem, passa sua discoteca básica então!

Ang Lo - Quantos discos? Os 10 mais, os 5 mais(risos)?

Shine - Todos que você quiser!

Ang Lo - Novos Baianos - Acabou Chorare / Ponto de Equilíbrio - Abre a Janela / RxDxPx - Terror Declarado / Halé- Sacolé de Morango / Nodora - Do pó ao Pó / Cause For Effect - Pq2 MCD / Hermeto Pascoal - O Ovo / por baixo é isso...Coloquei o nome de algumas músicas, pois não lembro o nome do álbum (risos)

Shine - Agora sim, solta o verbo!

Ang Lo - Gostaria de dizer para o mundo: não seja superficial, viva o que você diz, porque somente assim as suas palavras terão sentido. Leve a sinceridade em seu coração, sempre!

Shine - Está dito: acho que está ótimo!!!

Ang Lo - Valeu meu irmão, obrigado por tudo. Desculpe qualquer coisa. Precisando, "tamo aê" !!!(risos)

Shine - A entrevista foi toda ao som de Deep Purple daqui!

Ang Lo - Isso é um clássico! Aqui, foi ao som de Jamaica Groove...

comentários:

esse espaço é muito bom mesmo!! excelente. e o trabalho artistico excelente também. a entrevista então... mais descontraída e verdadeira que eu ja li. parabéns ao porão e ao ang lo. cangaceiro ninja amigo e irmão.
Anderson Ferracini + Nodora

Quero Agradecer ao Porão ao espaço cedido a banda Repúdio e as palavras do Dj Anj Lo sobre a minha pessoa.
Não sei se posso ser visto como empresario, mas por está a frente de um dos selos que lançou a banda tenho que fazer minha parte(é o minimo que deve ser feito).
Um selo não pode apenas lançar o disco e vender, o processo não é só isso, ele se estende e estou tentando fazer a minha parte.
Abraços
MICHAEL MENESES! - PARAYBA RECORDS!

Ôpa!
Vim parabenizar o blog e o espaço cedido para a entrevista.
O Ângelo aproveitou a oportunidade e falou bonito!
É ótimo poder ler um conceito mais pessoal do underground e saber o ponto de vista de quem o faz.
Vida longa ao Hardcore!
Sucesso ao Repúdio!
Beijos!

*Jeany Souza*

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